Espraiada nas proximidades da linha do Equador, a Indonésia alberga um dos mais importantes territórios do mundo para as tartarugas marinhas. Muitas espécies escolhem os areais das praias indonésias para nidificar e, nas águas redor, onde se cruzam os oceanos Pacífico e Índico, há importantes “autoestradas” oceânicas utilizadas pelas dóceis criaturas em migração. Tudo somado, e apesar de ameaçadas, seis em cada sete espécies de tartarugas existentes no planeta continuam, hoje em dia, a nadar pelas águas da Indonésia.
Ora, a Pikitim adora tartarugas. Gosta da história em que a proverbialmente lenta tartaruga consegue vencer a rápida lebre, assim como gostou de ver no cinema a história da tartaruga Sammy, apesar de não acreditar que as mães tartarugas abandonam os filhotes à sua sorte. Quando as viu, muito pequeninas dentro de um tanque no Centro de Educação e Conservação de Tartarugas (CECT), em Serangan, Bali, o seu primeiro comentário foi curioso: “as bebés tartarugas devem estar preocupadas, à procura da sua mamã”.
Depois de lhe recordarmos que as mamãs tartarugas depositam dezenas de ovos num buraco na areia e não esperam que os seus filhotes saiam dos ovos, a Pikitim insistiu em organizar a Natureza como ela acha que faz sentido: “Na verdade, a mamã destas tartarugas também deve estar preocupada com os seus filhotes, porque não sabe que eles estão aqui, a ser bem tratados”, concluiu.
Para a Pikitim, o CECT passou a ser o “hospital das tartarugas”, por ali haver algumas, já maiores, que se encontravam a recuperar de ferimentos ou doenças. “Recolhemos ovos e deixamos as tartarugas crescer antes de as lançarmos de novo no mar; mas também recolhemos as tartarugas que são apanhadas acidentalmente nas redes dos pescadores e ficam feridas”, explicou Made, funcionário do centro. A “maternidade”, essa, estava nas ilhas Gili.
Em Gili Meno, resultado da iniciativa individual de um homem chamado Bolong, centenas de pequenas tartarugas são preservadas dos predadores e da poluição, para serem lançadas ao mar quando possuírem reais hipóteses de sobreviver. Fomos conhecer este “Santuário das Tartarugas” durante um passeio de barco efetuado a partir de Gili Air, uma minúscula ilhota com pouco mais de 1.500 habitantes, onde pretendíamos ficar apenas três ou quatro dias e acabamos por ficar dez.
Estar com tartarugas na praia era, aliás, um dos principais motivos porque rumámos a Gili Air. E assim foi. Pode não haver tantas tartarugas como há vinte anos – por isso o governo indonésio, com a ajuda do World Wildlife Fund, estabeleceu leis e criou lugares como o CETC para garantir a preservação de espécies ameaçadas. A Pikitim já tinha “encontrado o Nemo” e visto peixinhos coloridos, mas faltava-lhe encontrar tartarugas em alto mar. E as três ilhas Gili ofereciam essa possibilidade.
Se Gili Meno é a mais pequena e menos desenvolvida e Gili Trawagan a mais sofisticada, festeira e turística, Gili Air situa-se a meio caminho entre ambas. Foi, por isso a nossa escolha.
É fácil apaixonarmo-nos por Gili Air e a Pikitim foi das primeiras a cair de amores. Os bungalows onde nos alojámos eram “casinhas muito engraçadas, que têm o telhado até ao chão”. São os lumbungs, inicialmente usados pelos, os habitantes originários de Lombok – sasak – para recolher cereais mas cuja arquitetura rapidamente proliferou pela ilha. E não há estradas alcatroadas, nem barulhos de motos ou de carros. Em Gili Air só circulam carroças e bicicletas: “Assim é muito mais tranquilo atravessar a estrada. Em Portugal também podia ser assim, não achas?”, disparou a Pikitim.
Estava-se muito bem em terra, onde a comida era boa (sobretudo o peixe fresco, acabado de pescar) e as praias tinham areia “branquinha, branquinha”, e muitos corais mortos, também. E estava-se melhor ainda no mar – a água era quentinha e quase sempre transparente. Foi logo ao segundo snorkelling a partir da praia que a Pikitim realizou um dos seus sonhos e viu uma tartaruga a nadar em alto mar. “Elas parecem que estão a voar, mamã! É tão bonito”, relatou entusiasmada.
E nem é preciso afastarmo-nos muito da costa. Umas braçadas mar adentro e estamos por cima de uma pequena barreira de corais (já muito estragados, boa parte deles mortos) onde há muitos peixes coloridos e, a par e passo, as tartarugas se passeiam. “É tão bonito, mãe, é tão bonito!”, repetia, entusiasmada.
A Pikitim e o pai foram os “privilegiados” – encontraram a tartaruga mesmo ali ao pé da praia. A mãe só as viu num passeio de barco onde se para em pontos específicos onde costumam passar tartarugas. E pôde confirmar que “o voo das tartarugas” é mesmo muito bonito. Pena é que seja preciso haver “hospitais” e “maternidades” para garantir que os mares indonésios continuam a ser frequentados pelas lindíssimas criaturas.
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