Estava a Pikitim ainda meia febril, a sair do hospital de Lanta, e nós, para a entusiasmarmos, falamos da ilha para onde iríamos de seguida, com a possibilidade de fazermos mergulho e nadarmos com tartarugas. Ficou incrédula. “E baleias, pai, há baleias?”. Não Pikitim, aqui não há baleias. “Ufa, ainda bem. Porque baleias, bruxas e dinossauros, como aqueles que viviam na terra há muitos, muitos anos é do que eu tenho mais medo”, explicou.
Os nossos planos passavam por ficar três dias em Koh Muk e a partir de lá fazer uma incursão ao parque natural de Koh Rok, apontado como um dos lugares mais interessantes para fazer mergulho na região. Não sabendo, nem podendo mergulhar, a Pikitim encontraria naquelas águas ao largo de Koh Ngai e Koh Kradan mais um bom local para fazer snorkelling.
Naturalmente, a Pikitim não encontrou baleias, nem bruxas, muito menos dinossauros. Até porque nem sequer conseguiu ir mergulhar, porque uma febre intermitente se transformou numa irritante estomatite que a impediu de comer e lhe retirou muita energia. Apesar dos contratempos com a saúde da petiza, a ambiência da ilha e a qualidade das suas praias e equipamentos – nada de luxos (aliás, a eletricidade chegou há pouco tempo a Koh Muk), nem demasiada construção – fez com que a curta estadia em Muk a catapultasse diretamente para o top dos destinos preferidos na Tailândia.
Porque é que um sítio onde só ficamos três dias, com uma petiza doente a maior parte do tempo, pode ser assim tão marcante? Talvez pelos magníficos pores-do-sol que se assistiam a partir da praia Farang, perto de onde alugamos um pequeno bungalow; talvez pelos poucos (mas bons) equipamentos de praia; talvez pelos bons e baratos restaurantes. Ou talvez pelo calor com que fomos acolhidos por Pauline e Richard, um casal de holandeses que passa seis meses por ano no Algarve e os outros seis em Koh Muk, vivendo os doze meses do ano com clima estival. E assim, durante a época do turismo na Tailândia, estão à frente do Chill Out Divers, um bar que é um clube de mergulho e onde também se organizam aulas de ioga (dadas por altura do pôr do sol). Sim, foi por eles e pela boa onda que emana da ilha. Definitivamente.
O Chill Out Divers transformou-se em “segunda casa” e a facilidade com que a Pikitim travou amizade com a “Paulina” ajudou a esta boa sensação. A prontidão com que lhe contou a sua história e os planos desta volta ao mundo fez-nos reconhecer a filha tagarela que, em viagem, se tem revelado tão tímida com os estrangeiros. Definitivamente, a Pikitim tinhas saudades, e vontade, de falar em português com outras pessoas. Para ajudar à festa, os sócios de Pauline e Richard, um casal britânico-tailandês, tinha um filho de três anos, o Lincoln, com quem a Pikitim passou o tempo a brincar, à volta de livros e canetas ou a jogar às escondidinhas e à apanhada.
O Chill Out Divers fica em plena praia Farang, embora muitos lhe chamem “Charlie Beach”, por este ser o nome do principal resort da praia. É uma praia bem menos extensa do que outras na ilha, uma ilha com declives na costa que tornam alguns areais inacessíveis por terra. É o caso daquela que é agora uma das principais atrações turísticas do mar Andaman tailandês.
A “Emerald Cave” é uma gruta com entrada pela costa, e que tem um percurso de cerca de 80 metros de extensão efetuado na mais completa escuridão, terminando numa mini-praia de areia branca rodeada por altas falésias. Soubemos da gruta mal chegamos a Koh Muk. A maioria dos visitantes atravessam a gruta a nado, enfiadas em coletes salva-vidas vermelho-vivo, seguindo um guia local que empunha uma potente lanterna. Com a Pikitim foi diferente. Começou por dizer que não queria ir à gruta, que tinha medo, mas a verdade é que, quando no dia seguinte o pai a convidou para um passeio de caiaque, não resistiu.
A maré estava vaza, e a lanterna a funcionar (pensava o pai). O pai pagaiou durante uns bons trinta minutos da praia Farang até à entrada da gruta. Boa parte do percurso foi feito na escuridão total, seguindo apenas as lanternas de um grupo de turistas que nadavam em sentido contrário. A lanterna na cabeça iluminava pouco mais que a proa do caiaque – era inútil, portanto. A Pikitim não teve medo mas, quando chegaram ao final da gruta, disse que , afinal, a praia não era “nada de mais”. E tinha razão. Na verdade, é o percurso em si que a torna emocionante, se bem que custa a acreditar que, por volta do meio-dia, quando que o sol consegue iluminar diretamente as águas da “lagoa”, o lugar tenha tudo para ser mágico. Aliás, toda a ilha tem.
Sendo a terceira maior ilha do mar de Trang, Koh Muk é ainda assim relativamente pequena. A praia Farang fica a menos de seis quilómetros da principal aldeia, implantada ao lado do porto de Sapanyao. É desse lado, na costa oriental, com uma orografia bem mais plana, que há mais praias. Como a de Hua Laem, ou ainda a de Sivalai, numa localização privilegiada, com uma língua de areia alva e um resort fantástico, de fazer corar de inveja algumas praias bem mais publicitadas do planeta. O resort é naturalmente privado, mas a praia é pública, e foi lá que a Pikitim deu um dos últimos mergulhos em Koh Muk – mas teve azar, e fez um pequeno corte num pé, num coral morto.
Apesar dos dissabores que enfrentou, a Pikitim chegou a dizer que nunca se esqueceria de Koh Muk, porque “era uma ilha muito bonita”. “É a ilha das borboletas”, batizou-a, tantas eram as que esvoaçavam à porta do nosso bungalow. Por várias vezes a Pikitim ficou paralisada, de braços abertos, à espera que uma delas lhe pousasse. “Elas andam à volta das flores cor-de-rosa. E eu estou vestida de cor-de-rosa. Podiam pousar em mim, eu gostava…”. Mas acabou por desistir. “Não vão pousar, porque os meus braços são cor-de-pele”, condescendeu.
Apesar disso, gostou tanto das borboletas que decidiu desenhá-las no seu diário. “Vou ter de desenhar as borboletas e esta lua linda que está por cima das nossas cabeças”, disse ela, na última noite que passamos em Koh Muk. A lua estava, de facto, imponente, quase cheia. A despedida perfeita de um lugar muito especial.
Ana Duarte diz
Que saudades de viajar. Chega-se a suspirar com tais relatos. Parabéns e continuação de boa viagem.
J. Gonçalves diz
Tenho acompanhado com curiosidade a descrição das vossas aventuras por essas terras distantes e sempre que leio mais uma das vossas descrições, ocorre-me um sentimento de uma certa inveja: aqui em Portugal tiritamos de frio e vocês aí nessas praias paradisíacas !
Carmen laura diz
Amigos estou maravilhada com as andanças de vcs e ainda mais com as reações da Pitikim. Bjs.