Os asiáticos são loucos por compras e centros comerciais mas, felizmente, apesar de haver shopping centers em abundância ao virar de cada esquina, sobretudos nas grandes cidades, a tradição dos pasar malam, os mercados noturnos de Singapura, Malásia e Indonésia está bem viva. Para os locais, os night market são uma espécie de feira onde se compram os frescos para o dia seguinte, bugigangas, trapos, acessórios ou calçado e, claro, se faz uma refeição nas movimentadas bancas de comida. Para os turistas, é o sitio das pechinchas (os de Kuala Lumpur, capital da Malásia, por exemplo, são reconhecidos pelas bagatelas em couro e pela roupa mais ou menos fashion) e, sobretudo, exigências sanitárias à parte, é o local ideal para constatar a diversidade gastronómica com a certeza de provar algo cozinhado na hora feito por mãos nativas. Foi isso que nos levou ao pasar malam de domingo em Langkawi, que tem lugar na povoação de Beras Terbakar. E encheu-nos as medidas.
Na ilha de Langkawi, na Malásia, há todos os dias mercados noturnos em localizações diferentes – só repete o do centro da principal cidade da ilha, Kuah, que acontece duas vezes por semana. Disseram-nos que o de sexta e o de domingo eram “os melhores”. Falhamos o de sexta, ao de domingo não poderíamos faltar – iríamos lá jantar.
Nos restaurantes tradicionais há sempre o conforto de um menu (muitas vezes com a necessária tradução) e, boa parte das vezes, um prato ou outro que conseguimos reconhecer. Nos night markets – e, no fundo, em todas as bancas de comida, as food stalls, que são um clássico por toda a Ásia – podemos ver a comida a ser confecionada na hora (o que não quer dizer que consigamos adivinhar o que temos pela frente – mas esse é apenas um dos aspetos que torna a “aventura” mais emocionante).
O termo aventura não é mal empregue – foi a Pikitim que o utilizou quando deduziu que se era um mercado noturno deveria ser exclusivo dos crescidos, e que ela e a amiguinha Margarida (uma menina portuguesa, um ano mais velha que a Pikitim e que foi a sua companheira inseparável durante a estadia em Langkawi) estavam com muita sorte em poder “ir ao night market às compras, comer e brincar”.
Chegamos a Beras Terbakar perto das sete da tarde. Já estava o recinto cheio de gente e, afinal, reparou depois a Pikitim, havia por ali muitas crianças. Encontramos muitas vezes crianças à noite em Langkawi, um destino muito popular também para o turismo interno. Estavam à mesa dos restaurantes para jantar, todos lavadinhos e fresquinhos e… já de pijama vestido. Como se da mesa fossem diretos para a cama. E o night market não era exceção. Não havia propriamente mesas paras as crianças se sentarem – nem para elas nem para ninguém – mas também isso era de somenos relevância. Miúdos e graúdos passeavam por entre as bancas dos comerciantes e, sobretudo, pelas bancas de comida, selecionando o que haveria de ser o jantar pela visão e olfato. O paladar só havia de ser confirmado posteriormente e, como é obvio, desmentiu algumas das decisões tomadas com os olhos.
Antes de nos aventurarmos nos pedidos fizemos uma ronda rápida pela zona da alimentação; e a primeira decisão que tomámos foi onde buscar a sobremesa. Em fritadeiras gigantes estavam a verter uma massa que demorava menos de cinco minutos a cozinhar e ficava com a textura de um pequeno queque. Havia de quatro sabores diferentes: bolos de feijão, de grão de bico, de ovo e de algo ininteligível. Provamos todos. E como eram docinhos, estes “cupcakes” da Malásia.
As crianças também tomaram decisões rápidas sobre a refeição principal. A Pikitim e a Margarida encontraram uma banca que vendia batatas fritas aos palitos dentro de copos de plástico e espetadas que, diziam elas, “pareciam mesmo douradinhos de frango”. Perguntámos se era frango – que sim, que era. Se era picante – não, que não era. Pedimos uma para experimentar, e compramos de seguida uma para cada uma. E havíamos de lá voltar segunda vez.
Os adultos tiveram bastante mais dúvidas nas escolhas, apesar de terem percebido que as bancas de nasi lemak e nasi goreng eram as mais populares. Nasi indicaa arroz em malaio, o principal ingrediente da rica gastronomia do país, que resulta de uma fusão multicultural de influências chinesa, tailandesa e indiana. O nasi lemak é uma espécie de fried rice tailandês, mas o arroz é cozido em leite de coco, o que o torna mais aromático, e é servido com anchovas, amendoins e ovo cozido. Lemos que este é o pequeno almoço típico da Malásia, mas a verdade é que se come a qualquer altura do dia e conta com bastantes variações. Uma das mais populares é com ayam goreng – literalmente, frango frito. E aqui é que dá jeito perguntar se é ou não picante.
Espreitamos as espetadas, as gigantes frigideiras onde se faziam noodles na hora, mas acabamos por não resistir ao nasi goreng, o tal arroz aromatizado (e sempre muito sticky, literalmente pegajoso, o que dá um certo jeito para comer à mão, como convém), acompanhado por um pedaço de frango frito. Pudemos escolher entre as bancas que o mostravam com melhor apresentação – e optar entre as que serviam o arroz em embalagens de plástico ou em bem mais ecológicas folhas de bananeira. Mas, por mais consciência ambiental que demonstrássemos, nada havia a fazer contra a quantidade de especiarias e molhos picantes que nos entregavam em sacos plásticos fechados com um elástico a acompanhar a refeição. Para as miúdas, o mais divertido foi assistir às mães desajeitadas a comer o arroz com as mãos; ou, mais difícil ainda, a “espécie de empada de frango com muitos e irreconhecíveis vegetais” que não resistiram a comprar mas que se desfazia em
óleo (demasiado gordurosa) e que era impossível comer à mão. Nesta altura, pensava a mãe da Pikitim, até uns pauzinhos chineses dariam jeito. No final, miúdos e graúdos estavam saciados por uma verdadeira pechincha.
Após o jantar, passeámos entre as restantes bancas dos comerciantes, notámos as incríveis cores de alguns sumos e sobremesas (feitos com corantes de cores inacreditáveis, como azul petróleo, ou laranja elétrico) e comprovamos o cheiro terrível de um durian a ser partido (o durian é um fruto comum por toda a Ásia que cheira tão mal ao ponto de, por exemplo, ser proibido nas estações de metro em Singapura). Tempo ainda para mirar, entre as bugigangas e acessórios para o cabelo, aquelas que seriam aceitáveis para os gostos ocidentais.
Para as miúdas, de repente, tudo lhes parecia lindo e maravilhoso, mesmo umas horríveis Croc a simular umas pata de um monstro. Sentiam-se à vontade para experimentar sandálias e havaianas, para tirar ganchos e por travessões, para ver tamanhos de vestidos e t-shirts. E os comerciantes também pareciam achar piada aos pequenos furacões que em tudo mexiam, mas nada compravam. Ou quase nada, vá lá. Que a Pikitim teve autorização para escolher uma pulseira para ela – primeiro pegou numa cor-de-rosa; depois trocou por uma azul, porque havia duas iguais e ela queria oferecer uma à Margarida. “Esta noite foi mesmo divertida, não foi Margarida?”, dizia a Pikitim, no banco de trás do carro de regresso a Patai Cenang, de mãos dadas e com as respetivas pulseiras.
Ana Duarte diz
Os mercados e a gastronomia… São das coisas que mais me encantam nas viagens. Ambos nos fazem entrar na vida quotidiana do povo que visitamos, faz-nos ter a sensação de viver e experimentar a vida que levam. Adoro!! Adoro o colorido, os barulhos, os aromas dos mercados. E adoro as novas experiências gastronómicas.
Continuação de boa viagem e boas aventuras