Uma das perguntas recorrentes que me fazem acerca da nossa viagem em família à volta do mundo é como se decide a bagagem para um ano. A regra de ouro é a de que só devemos pôr na mala o que é realmente necessário, porque o peso de todas essas necessidades será sentido pelos nossos braços e costas. E até uma criança consegue perceber – e cumprir – esta regra.
A Pikitim participou no processo de “fazer a mala” desde o início. Andou dias a pensar no que deveria levar, a meter e a tirar os seus objetos preferidos da mochila nova que lhe deram no Natal.
Ela foi rápida na seleção das roupas (que lhe dissemos que estava dispensada de levar na sua mochila já que a sua roupa iria dividida pelas malas da mãe e do pai) mas demorou muito tempo a decidir o que haveria de levar sempre perto de si, os brinquedos e livros que a deveriam acompanhar durante a viagem.
Tinha tentado deixar-lhe bem claro que teria de ser sempre ela a levar a sua mochila – porque os pais também tinham malas e mochilas, bem maiores, para carregar. Por isso, o melhor seria que as suas escolhas não fossem muito pesadas, até porque, apesar de a mochila ter rodinhas não andava sozinha!. “Tens sempre de ser tu a puxá-la!”, avisei. E ela reagiu muito bem à “responsabilidade” que lhe estava a atribuir. Ela, afinal, era “uma menina crescida”.
A Pikitim aceitou o desafio com entusiasmo, mas não deixou de ser um processo longo. Avaliar as coisas que gostava mais e aprender a separar-se das muitas outras que também gosta. Por exemplo, do pequeno computador da Minnie que tinham acabado de lhe oferecer. O problema é que ocupava uma boa parte da mochila e roubava-lhe o espaço que queria encher com livros. O espaço foi, como é compreensível, o seu principal problema.
Quando constatou que não caberia tudo o que queria levar naquela mochila, ainda apelou a que o pai ou mãe levassem uma boneca, um livro, um jogo na sua mala, mas, pela resistência na resposta lá acabou por desistir, e enfrentou o “desafio” de frente.
Começou por separar os livros. Tirou dezenas das prateleiras. Pouco depois lá percebeu que seria melhor deixar os mais volumosos para trás, mesmo que adorasse as histórias que eles contavam. Acabou por selecionar apenas dois de capa dura, e percebeu que teria melhores resultados (isto é, levaria mais histórias) se optasse pela coleção de livros de bolso com histórias tradicionais – aqueles livrinhos que custam menos de 1€ e que há à venda nos supermercados.
Meteu ainda na mochila uma caixa cheia de polly pockets (uma excelente invenção já que, tal como o nome indica, são bonecas em formato bolso, que trazem os respetivos acessórios em tamanhos quase microscópicos), um estojo com uma dezena dos seus DVDs preferidos (filmes da Disney, que pedia para ver no computador da mãe), lápis de cor, canetas e dois cadernos para desenhar.
E, claro, o Moleskine preto, onde iria fazer o seu diário. No final das páginas deste caderno ainda imaculadamente em branco assinalou com um grande coração o local onde pretendia guardar a carta com os beijinhos que lhe deram os amigos no último dia que passou na escola. “A minha carta vai ficar sempre guardada aqui. Assim, quando abrir o meu diário, posso voltar a olhar para a carta e lembrar-me dos meus amigos e da minha professora”, explicou.
Separou ainda mais uma série de objetos que tinha recebido no natal. Os familiares e amigos empenharem-se em oferecer-lhe novidades a que ela não conseguia resistir: uma Barbie/Bela Adormecida, um estojo com bananagrams, uma máquina fotográfica e um mp3, e dois jogos de cartas: o Uno, da Dora, e o “Geofamily”. Com a mochila já a rebentar pelas costuras enfiou-lhe, é claro, o mais importante do que tudo o resto: o seu companheiro de peluche, o coelho Pipocas. “Consegues carregar essa mochila? Vê lá se não está muito pesada…”, insistia eu. “Consigo, mãe! Claro que consigo!”, garantia.
Durante os oito meses que durou a viagem, a composição da sua mochila não sofreu grandes alterações. Como qualquer criança, que vê um brinquedo que gosta na prateleira de um supermercado ou na montra de uma loja, a Pikitim fez muitas vezes a pergunta. “Ó mãe, posso comprar ou é muito caro?”. Eu dizia-lhe o preço. Mas rapidamente lhe demonstrava que há outros critérios igualmente importantes: como é que o levas na tua mochila? Será que cabe lá dentro? Como ela já está cheia, o que é que tiras de lá para esse novo brinquedo entrar?
A verdade é que a Pikitim rapidamente deixou de pedir para comprar coisas, e habituou-se a comprar só aquilo que precisava. E do que precisava, com mais frequência, eram folhas e lápis para desenhar, e canetas e lápis de colorir. Houve, como é obvio, objetos que foram mudando de lugar. Polly Pockets que se perderam, brinquedos e até livros em português que quis deixar a um novo amigo acabado de conhecer. “É para se lembrar de mim, quando eu for embora”, explicava ela.
Foi por isso que a Bela Adormecida que foi de Portugal ficou em Tanna (Vanuatu) com a Emily, uma menina que vivia numa aldeia próxima e que vinha sempre brincar com ela. E o Koala e o Canguru, dois peluches gigantes, pelo menos para a mochila que levava, que lhe tinham sido oferecidos pelo amigo João (um alentejano que fez questão de nos acolher em Mandurah, na Austrália, depois de termos esbarrado com a sua filha de 25 anos no voo de avião que nos levou a Perth), acabaram por ser oferecidos a novos amigos, crianças que conheceu algumas semanas depois.
Guardou os desenhos do Koala e do Canguru, e disse que não se ia esquecer do João. O koala foi oferecido ao Edgar, o amigo mexicano com quem brincava na Nova Caledónia; o canguru foi oferecido a Sarona, a filha mais nova da nossa simpática anfitriã em Port Vila, a capital de Samoa. E argumentou que, assim, tambem o Edgar e a Sarona não se iriam esquecer dela.
A Pikitim compreendeu muito bem a regra de ouro – o de carregar só o que realmente precisa. Por isso desistiu do jogo das bananagrams, com que quase não brincava, e ia enviando para Portugal todos os cadernos já cheios de desenhos.
E vocês, como preparam a mochila dos vossos filhos?
Xana diz
A mim parece-me incrível, dado que levo mais bagagem para um fim-de-semana do que vocês para 10 meses 🙂
Parabéns pelo blog, está muito giro!
Luísa Pinto diz
Olá Xana,
Se tivesses de carregar o que levas durante muito tempo também conseguias!
Nós quando vamos passar um fim de semana a qualquer sítio, e temos uma bagageira de um carro à disposição, também somos capazes de não ser tão espartanos 😉
Luisa Sousa diz
Nada como ter de transportar todo o peso às costas, para aprender a separar o essencial do supérfluo! 😉 E acabamos por ver, que afinal, não precisamos assim de tanta coisa.
Obrigada pela vossa partilha! 🙂
Luísa Pinto diz
É isso mesmo, Luísa!
Muitas coisas que achávamos que eram importantes não nos fazem, afinal, nenhuma falta! Não precisamos de tanta roupa como a que temos no armário, isso de certeza 🙂
Um beijinho