Há escolhas felizes, e Koh Jum foi uma delas. A ilha encontra-se no ponto perfeito de desenvolvimento, um meio termo que preserva a autenticidade tailandesa sem o crescimento desenfreado a que chamam progresso visível noutros locais do sul do país. Uma delícia, Koh Jum – pelo menos por enquanto.
Daqui a uns anos estará porventura transformada numa nova Phuket, Railay ou Phi Phi, mas por ora os bungalows ainda são de madeira tosca, não há vendedores a incomodar nem água quente nos chuveiros, as garrafas de plástico não se acumulam no areal, boa parte das estradas não são alcatroadas, a poluição é residual e a actividade primordial não é beber cerveja – antes apreciar a natureza, relaxar, viver devagar.
Koh Jum não tem sequer uma língua de betão conquistada ao mar para fazer de ancoradouro na costa oeste da ilha, onde existe um longo areal e se concentra o alojamento em bungalows, facto que torna as chegadas e partidas à ilha numa emoção. Isto porque a paragem dos ferryboats que ligam Krabi a Koh Lanta, e de permeio param ao largo de Koh Jum, faz-se em alto mar, em pontos predeterminados onde os passageiros saltam para pequenos barcos enviados pelos donos dos bungalows. Nós saímos na primeira paragem, mais a norte, cuja paisagem rochosa e selvagem é dominada pela montanha Pu que se eleva a pouco mais de 400 metros de altitude – o suficiente para ser notada.
Para quem, como Oon, vive em Pu, foi precisamente essa costa rochosa, o acentuado desnível e a protecção geográfica proporcionada pelas ilhas Phi Phi, adiante, que há sete anos lhes valeu por altura do tsunami que devastou a região. “Sim, já estávamos cá e, felizmente, não nos aconteceu nada”, contou, apontando para as ilhas que os olhos vislumbravam no horizonte: “As Phi Phi é que ficaram todas destruídas”, concluiu. Oon é tailandês, casado com uma francesa e, juntos, construíram um refúgio acolhedor onde nos alojámos em Koh Jum.
A localização que o salvou no tsunami obriga-os – e a nós, visitantes – a demoradas deslocações, já que boa parte das praias, escolas, supermercados e demais infra-estruturas se situam na zona sul da ilha. Para quem não tem transporte próprio, uma viagem a Baan Koh Jum, a principal aldeia da ilha, ainda assim minúscula, implica uma caminhada pela praia, a subida até uma estrada de terra vermelha toda esburacada onde os tuk tuk não se atrevem a entrar e nova caminhada por entre seringueiras até um ponto designado por Magic Beach, onde um tuk tuk haveria de vir ao nosso encontro para nos levar por estradas de terra e placas de cimento até Baan Koh Jum (a principal estrada da ilha está ainda a ser construída, com velhos carris ferroviários a fazer de moldes onde assenta o betão – não asfalto).
Certo dia, estávamos na aldeia quando vimos uma mensagem cibernética: “Estamos a caminho de Krabi e depois de Koh Jum, hoje mesmo. Devemos chegar à ilha amanhã de manhã. Escrevam qualquer coisa ou telefonem.” Vinha assinada pela dupla Rafael e Tânia, amigos viajantes que empreendem neste momento uma viagem de bicicleta entre Portugal e Macau. O “hoje” tinha apenas dois dias – íamos a tempo. Ligámos e, horas depois, partilhávamos com a dupla ciclista as águas quentes e o extenso areal fino e branco de Long Beach, a maior praia do sul da ilha. E a Pikitim pode falar português com outras pessoas que não os pais.
Para além do reencontro com velhos amigos e do ambiente relaxado de Koh Jum que prende viajantes durante semanas a fio, em Long Beach havia também uma dezena de crianças de tenra idade, alemãs e nórdicas, parceiras ideais para brincadeiras na água com a Pikitim. Foi uma festa, portanto, e de novo os dias foram passados mar adentro, horas a fio. Num desses momentos, ao ouvir o nome das ilhas que pontilhavam o horizonte, a Pikitim espantou-se: “A sério que aquelas ilhas se chamam Pipi, mãe? Mas chamam-se Pipi como o meu ‘pipi’?”. E desatou à gargalhada.
Foi precisamente nas imediações das ilhas Phi Phi que a Pikitim se estreou no snorkelling, durante um dia inteiro dedicado a “ver peixinhos” num passeio de barco organizado a partir de Koh Jum. A correnteza estava um pouco forte para a petiza quando o barco ancorou nas proximidades da ilha Bamboo. A ideia de colocar uma máscara na face só foi aceite após alguma resistência, um primeiro mergulhar meio a medo, de olhos fechados, e então sim, perdido o receio, o mundo subaquático abriu-se-lhe diante das pupilas. Primeiro ao largo da ilha Bamboo e depois em plena Maya Bay, já dentro do Parque Nacional Marinho das ilhas Phi Phi e com o mar incrivelmente límpido e tranquilo, era vê-la nadar com o rabito espetado no ar e a cabeça submersa no oceano, em apneia, excitadíssima, gritando de contentamento enquanto observava uma miríade de peixes à sua volta.
Surpreendentemente, a Pikitim aguentava bastante tempo a fazer apneia – mais do que a própria mãe, aliás! – e, quando vinha à superfície, não demorava mais do que o necessário para encher o peito de ar. De uma das vezes que veio à tona, verdadeiramente deslumbrada com a descoberta do mundo submarino, virou-se com um olhar radioso para o companheiro de mergulho e, sem esperar resposta, perguntou: “Pai, não é maravilhoso?” [ver vídeo #4]. E de novo mergulhou a cabeça nas águas translúcidas de Maya Bay.
Rodrigo de Almada Martins diz
Acompanho a crónica da Pikitim desde o primeiro dia. E, no Fugas, é sempre com alegria que leio as vossas aventuras nas mais diversas paragens deste planeta, tão grande e tão pequeno.
Desejo aos 3 a continuação de uma grande viagem. Não deixem de nos dar notícias, sempre com a forma abrangente e multicultural como o vêm fazendo até aqui.
Divirtam-se! Por cá, leio e releio os vossos relatos para me ir inspirando para viagens do mesmo género!
Luísa Pinto diz
Olá Rodrigo
Muito obrigada pela simpática mensagem e sobretudo obrigada pela boa companhia que nos vai fazendo!
Um abraço
Sandra diz
Não consigo parar de ficar deslumbrada com o colorido da escrita e a forma como me transporta. Obrigada 🙂