Chovia torrencialmente quando o táxi nos deixou no Baiduri’s Place. A trovoada tinha começado na curta corrida de táxi entre o terminal de ferry de Kuah, principal cidade de Langkawi, e a praia de Cenang, onde iríamos passar os dias seguintes. Assim que pousamos as mochilas no quarto, Rajis, a simpatia malaia que geria a pousada, avisou-nos que uma senhora com uma menina tinham estado à nossa procura na pousada. Foi a melhor surpresa que a Pikitim poderia ter.
Já lhe andávamos a falar há algumas semanas que talvez fosse possível encontrarmo-nos com uma menina portuguesa um pouco mais velha do que ela. Não as conhecíamos, mas a coincidência das datas da partida e destinos similares levou Joana, mãe da Margarida, a contactar-nos quando soube da viagem da Pikitim. Andámos desencontrados por poucos dias em algumas ilhas da Tailândia, e acabou por ser na Malásia que as duas meninas finalmente se puderam encontrar.
Tornaram-se amigas instantaneamente. Parecia que ambas estavam com saudades de falar em português com alguém da mesma idade. De brincar em português. De rir em português. De comunicar sem barreiras. É que, por mais que outras crianças tentem brincar com a Pikitim, fazê-lo em inglês – ou sem falar – não é a mesma coisa. E por mais paciência e empenho que tenham os pais para brincadeiras infantis, não há como a sintonia entre duas crianças da mesma idade, que gostam das mesmas coisas e, lá está, que falam a mesma língua.
De tal forma que, quando na primeira manhã nos encontramos em Patai Cenang, uma das mais populares praias da ilha, com areias brancas, águas cristalinas e uma mão-cheia de actividades e desportos náuticos à disposição dos veraneantes, as miúdas praticamente ignoraram a praia e o mar – coisa rara na Pikitim. Só pediam para estar em casa, a brincar com as bonecas ou fazer desenhos. E era bonito vê-las juntas, cúmplices, dando asas à imaginação.
Certo dia, foi também bonito levar a imaginação de duas crianças ao cimo do monte Machincang. A proposta que lhes fizemos foi a de “subir até às nuvens” no teleférico de Langkawi e, uma vez lá no alto, fazer um passeio na sky bridge, uma plataforma suspensa no cimo da montanha que permite “passear no céu”. A ideia agradou-lhes.
Desde que avistaram o sistema de teleférico, no exterior do centro comercial Oriental Village – um complexo ao ar livre cuja estrutura faz lembrar o outlet de Alcochete –, que a imaginação e curiosidade das crianças não mais parou. “Vamos, vamos, por favor!”, pedia a Pikitim, dizendo que o teleférico era um “pé de feijão mágico” e antecipando que a subida ia ser “emocionante”.
“Sabes a historia do João que tinha um pé de feijão, Margarida? Nós temos estas casinhas com asas (não têm asas, mas faz de conta), que nos levam até às nuvens! Não é divertido, Margarida?”, exclamou a Pikitim, apontando para as cabines visivelmente entusiasmada. Entrámos para a cabine do “pé de feijão” com o teleférico em andamento, preparando-nos para uma subida com 1.700 metros de extensão até à primeira plataforma. A reacção das miúdas era à para nós uma incógnita (ficariam apavoradas ou excitadas?), mas a verdade é que, durante a subida, nenhuma delas mostrou qualquer medo, e a Pikitim até reclamou que as cabines andavam “muito devagar”.
Quando chegámos ao topo, deliciámo-nos o mar transparente, a ilha principal, os muitos ilhéus circundantes e a Tailândia no horizonte. A Margarida disse logo que era “muito bonito”, enquanto a Pikitim efabulava que o castelo do ogre estava no ilhéu ao lado do Machincang. Teria vivido no mar, esse ogre, já que os geólogos encontraram provas de que há 450 milhões de anos aquelas formações rochosas estavam submersas.
As pequenitas continuaram a inventar histórias sobre quem viveria naquelas nuvens, mas o entusiasmo aumentou quando perceberam que, para chegar à dita ponte, tinham de percorrer um pequeno trilho pelo meio da floresta. “Boa, vamos! Pode ser que encontremos macacos!”, gritou a Pikitim.
Surpreendentemente, a chegada à sky bridge deu lugar a pergunta sérias: “Mas como é que conseguiram trazer esta ponte para o cimo da montanha?”, perguntou a Margarida. A estrutura impressiona, de facto. Suspensa a partir de um poste único de 82 metros, a ponte curvilínea tem 125 metros de extensão. Ao caminhar, a plataforma balança ligeiramente e, pelo seu desenho curvo, dá mesmo a sensação de se estar no meio de nada, suspenso entre as nuvens. No final do passeio, os veredictos: “O que eu mais gostei foi do passeio nas nuvens”, garantiu a Margarida; “eu gosto mesmo é do pé de feijão mágico”, disse a Pikitim, que continuava a preferir a adrenalina da subida e descida do teleférico.
Para elas, tudo era uma aventura. Fosse conhecerem as cascatas da ilha e procurar “bichinhos no meio da natureza” ou perderem-se entre as bancas do “night market” de Beras Terbakar, evento que acontece todos os domingos e onde há bancas de roupa, fruta e de comida pronta para um jantar simples. Fomos para lá. E de novo a festa aconteceu. As meninas acharam divertido ver alguns meninos na feira já de pijama; estranharam comer com as mãos; adoraram umas espetadas de galinha e uns bolinhos de sobremesa que tinham acabado de ver fazer; não se atreveram a experimentar o “fruto que cheira a chulé” (o durian); e acharam “muita piada” aos sumos e bolos de cores ultra delirantes (feitos com corantes que iam do azul petróleo ao laranja eléctrico). E, após o jantar, as miúdas feitas senhoritas divertiram-se a apreciar roupa, calçado e todo o tipo de acessórios. “Está a ser uma noite bem divertida, não está, Margarida?”, perguntava retoricamente a Pikitim.
Com tamanha cumplicidade entre as meninas, as despedidas na tarde seguinte não foram fáceis. A Margarida e a mãe Joana seguiriam para Kuala Lumpur, nós para Manila. Pensativa, já depois do adeus, a Pikitim perguntou: “Quando as tuas amigas vão embora também ficas triste, mãe? É que hoje estou um bocadinho triste”.
Joana diz
Pikitins, que lindo recordar-vos. Depois desta crónica fico com pena de não ter ido ao cimo das nuvens. Enfim, fico com a descrição! A Margarida manda muitos beijinhos e continuação de boa viagem!
sandra diz
Fiquei com vontade de subir no pé de feijão mágico e andar nas nuvens 🙂
Marta diz
Boa tarde,
Tenho acompanhado a vossa viagem e adorei este artigo sobre Langkawi, onde espero também ir com a minha pituchinha de 10 meses quando ela for um pouco mais velha.
Pelo que li Langkawi é bastante cara, é possível encontrar alojamento económico? Obrigada e cont. de boa viagem.