Levar as crianças a viajar nem sempre significa levá-las para muito longe de casa. Às vezes nem precisamos de sair da cidade em que vivemos – podemos fazer grandes viagens no “nosso quintal”.
Lembrei-me disto no último fim de semana, quando não me deixei intimidar pelo domingo cinzento e fui ao Porto visitar as novas exposições que estão patentes no Centro Português de Fotografia (CPF).
Ter uma instituição como o CPF no Porto é um privilégio, e a qualidade das suas exposições já nem é notícia. O que se calhar precisa de um impulso nosso é recusarmo-nos a adiar a visita a lugares óbvios, e a manter a tendência de nos desviarmos dos sítios onde vão muitos turistas – acredito que haja portuenses desse lado que nunca tenham subido à torre dos Clérigos. A Pikitim mora perto do Porto e nunca subiu à Torre dos Clérigos. Mas já foi ver, com olhos de ver, o Centro Português de Fotografia, num domingo cinzento de chuva.
Quando viajamos para outras cidades estamos mais atentos, queremos fazer mais atividades. No nosso país, na nossa cidade, perto de nossa casa, deixamo-nos acomodar mais facilmente pela inércia.
Para as famílias que se queixam continuadamente de que não têm dinheiro para viajar, podem começar a fazê-lo assim, mais perto de suas casas, explorar o que tem à porta. Foi com esse espírito que fomos ao magnífico edifício da Cadeia da Relação, que está aberto inclusive ao domingo – das 15h00 às 19h00 – e onde a entrada é gratuita.
A parte mais empolgante para a Pikitim foi, precisamente, o edifício. “Já viste o tamanho daquela porta??? ”, questionou ela, logo à entrada, onde deixamos os guarda-chuvas, embasbacada por uma porta que deve ter três metros. Andou à procura de outras, e encontrou-as nos sítios mais inimagináveis, como na antecâmara de entrada das enxovias – “Como é que, algum dia, alguém conseguiu entrar e sair dali?”. Percorreu o edifício à procura de celas e de sinais de prisioneiros, e acabou por se contentar com as grades nas imponentes janelas.
Tinha-lhe contado a história que ali tinha sido uma cadeia, onde prendiam as pessoas que se portavam muito mal. E contei-lhe, também como a História está cheia de injustiças e como a lei vai fazendo alguns progressos – isto para justificar o facto de um homem e uma mulher terem sido presos só pelo facto de se terem apaixonado. E a estátua “Amor de Perdição”, a homenagem do mestre Francisco Simões a Camilo Castelo Branco e Ana Plácido, situada no largo com o mesmo nome, foi uma boa ajuda.
Andamos muito mais de uma hora a percorrer o interior do edifício e a contemplar as exposições. Ainda vimos a do Catalá-Roca, que permitiu mostrar-lhe como era Espanha nos anos 50, e demoramo-nos muita na do coletivo 12.12.12, que nos mostra como é o Portugal dos dias de hoje – e acredito que a Pikitim não se voltará a esquecer, por exemplo, da imagem de José António Rodrigues que nos mostra um homem a vasculhar nos contentores do lixo em Rabo de Peixe, nos Açores.
No acervo atualmente em exposição, destaque ainda para a exposição do “O Poeta da Reportagem – Ryszard Kapuscinsky”. É cedo para uma criança de seis anos recém feitos perceber o real alcance do trabalho deste jornalista. Mas não precisamos de adiar para mais tarde o contacto dos nossos filhos com a oferta cultural de qualidade.
Essa é a primeira inércia a combater. A segunda é a ideias de que são muito novos, que não há dinheiro para fazer incursões culturais, ou que as crianças estão melhor em parques de diversões do que em exposições de fotografias.
O que acham sobre isso?
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