É preciso muito pouco para viajar. Há, aliás, quem viaje pelo mundo tendo como bagagem uma mochila de escola, daquelas com 32 litros de capacidade, e não precise de mais. Mas a maioria não é assim. E nem sempre são respeitadas as regras básicas do bom senso na hora de fazer a mala. Porque “ainda cabe” e “nem pesa muito”, porque há aquela coisa que se queria mesmo, mesmo levar e “vou usar muitas vezes, de certeza”, ou porque a viagem é muito longa, justificações não faltam na hora de colocar na mala ou mochila mais uma peça de roupa, um par de sandálias ou botas, ou coisas que se têm por indispensáveis. E o resultado é sempre o mesmo: peso a mais. Para ajudá-lo a evitar alguns quilogramas nas próximas viagens, aqui ficam algumas dicas úteis na hora de preparar a bagagem. Mochila mais leve, precisa-se.
1. Usar mochilas pequenas
É garantido. Quanto maior é a mala ou mochila mais peso se carrega. Maior a tendência para a encher com equipamento que, numa bagagem mais pequena, decididamente não seria incluído. Se, ao olhar para um objeto, a reação for “nunca se sabe” ou “pode ser preciso”, o mais provável é que ele se venha a revelar totalmente desnecessário. Admito como exceção a esta regra de ouro o que diga respeito a precauções de saúde, especialmente se a viagem é feita com crianças, porque um kit de primeiros socorros e alguns medicamentos, apesar de idealmente nunca serem necessários, conferem uma enorme paz de espírito à mãe e ao pai. E mesmo assim, sem exageros, porque haverá quase sempre uma farmácia por perto.
Em suma, use malas ou mochilas pequenas. E não caia na tentação de argumentar que deixa espaço vazio para “trazer prendas”. É uma boa desculpa, mas o “espaço vazio” há de ficar cheio e a bagagem pesada. Mesmo antes de começar a fazer compras.
2. Em todo o lado se lava e vende roupa
É um facto que deve ser tido em conta na hora de selecionar a quantidade de roupa a transportar na bagagem. A maior parte dos hostels e hotéis têm lavandarias e, mesmo quando não têm, encontram-se lavandarias (ou quem lave roupa) com relativa facilidade em quase todas as povoações habitadas. Se vive gente, lava-se roupa – e isso é válido tanto para os habitantes locais como para os turistas. Em resumo, quem tem roupa suficiente para uma semana tem roupa suficiente para um ano de viagem.
E se a roupa se estragar com o uso, ficar esquecida algures ou se cansar de usar sempre as mesmas coisas? Não é drama algum, e o remédio é muito fácil. Basta comprar peças de roupa que substituam as antigas, porque há lojas e vendedores de roupa em todo o mundo. Mais: numa boa parte do planeta, encontrará vestuário – e calçado – mais barato do que em Portugal ou no Brasil. Por isso, não vale a pena ir carregado, porque há sempre a possibilidade de substituir o que fizer falta. E isto tanto se aplica aos pais como aos filhotes.
3. Uma viagem não é um desfile de moda
Convêm ter consciência que uma volta ao mundo é uma viagem de longa duração, diferente de uma semana no Algarve ou em Florianópolis. O importante na roupa e no calçado é ser prático e confortável, que não ocupe espaço, que pese pouco, que seja versátil nas utilizações e sirva a função para que foi destinada. Um polar é um polar, seja preto, vermelho ou azul – interessa é que proteja do frio. Uma camisa bem engomada combina na perfeição com uns sapatos aprumados e umas calças vincadas, mas valerá a pena carregá-los para serem utilizados apenas um par de vezes durante a viagem? E as botas da moda ou os saltos altos, serão mesmo fundamentais?
Em viagem, é necessário ter espírito de camaleão e adaptar-se ao meio envolvente. Mas, para isso, não é preciso um casaco de vison nem uma enorme mala Louis Vuitton. Ser discreto é, aliás, um dos melhores conselhos que viajantes experientes lhe darão. De resto, considere a escolha de itens que possam ser usados em múltiplas ocasiões, como é o caso das echarpes e das cangas. Em suma, na hora fazer a mala escolha a roupa por ser útil, versátil e prática, e não tanto por “fazer pendant”. E isso leva-nos ao ponto seguinte.
4. Vestir por camadas e escolher roupa técnica
Há uma regra de ouro entre todos os que praticam atividades ao ar livre, como trekkings em autonomia ou caminhadas, que deveria ser seguida por todos os viajantes: vestir por camadas. Basicamente, utilizar roupas leves que possam ser facilmente sobrepostas quando a temperatura desce, e o contrário quando está calor. Evitam-se combinações de equipamento específicas para cada uma das estações do ano, porque a maioria do equipamento é utilizado em todas as situações, por camadas, à medida das necessidades. E depois há os blusões em gore-tex ou corta-vento, mas só nos casos em que são mesmo necessários.
Para isso, a chamada roupa técnica é uma ajuda preciosa. Não ocupa espaço e é muito leve. Está pensada para funcionar em camadas. E tem quase sempre cores neutras, que o defendem da sujidade e de preocupações estéticas – se as tiver -, pois são de fácil conjugação. Mais importante: a roupa técnica é útil, prática e versátil. Aspeto contra: é mais cara do que a roupa dita normal.
5. Tenda e saco-cama são dispensáveis
Há quem não concorde. E eu respeito. Mas, excetuando os casos de longos trekkings e viagens em autonomia ou passadas em ambientes inóspitos, se viaja de bicicleta ou tem a absoluta necessidade de reduzir o orçamento ao mínimo, ou se acampar é precisamente um dos propósitos da viagem, não haverá muitas razões para transportar um saco-cama e uma tenda, durante um ano, numa viagem à volta do mundo. São artigos que ocupam espaço e pesam bastante (exceto os sacos-cama de verão, leves e finos, mas que, por isso mesmo, são ainda menos úteis) e a sua utilização será, regra geral, diminuta.
Para começar, boa parte dos hostels impede a utilização de sacos-cama próprios, como precaução contra a infestação de resistentes bed bugs, que viajam precisamente de hostel em hostel nas mochilas e sacos-cama dos viajantes. E, mesmo se tencione fazer um trekking durante duas semanas, talvez mais valha alugar o material de que necessita em vez de carregá-lo, inutilmente, durante as outras 50. É que, numa volta ao mundo clássica, há poucas situações em que tenda e saco-cama sejam fundamentais.
7. Transportar embalagens pequenas
Champôs, gel de banho, pasta dentífrica, protetor solar, desodorizante, creme hidratante ou que quer que julgue indispensável para se sentir bem e confortável, inclua na bagagem. É importante que se sinta bem, seja em casa ou em viagem e, por isso, leve. Mas não adianta tentar levar champô para um ano, um semestre ou sequer dois meses. Escolha embalagens pequenas dos produtos fundamentais e, quando chegarem ao fim, compre novos. A maior parte dos viajantes não passa mais de duas ou três semanas sem por pé numa localidade onde seja possível comprar produtos de higiene. E isso retira imenso peso da mochila. Parece óbvio, mas a verdade é que, por cautela em demasia ou apego a uma marca específica que pode não encontrar no estrangeiro, muita gente transporta quilos e quilos de produtos de higiene. Desnecessariamente.
8. Utilizar sacos de arrumação
Os sacos de arrumação existem em vários tamanhos, de formato regra geral retangular e com aberturas em rede para a roupa respirar. São leves, e servem o propósito de manter a roupa arrumada. Tornam o ato de fazer e desfazer a mala ou mochila muito mais fácil e rápido. E ajudam a controlar a quantidade de roupa que transporta (pode ter um saco onde têm de caber as t-shirts e sweatshirts, outro para item maiores como calças e um casaco polar ou corta-vento, outro para roupa interior, etc). São um dos grandes amigos do viajante independente.
9. Ponderar a não utilização de botas de montanhas
As botas de montanha, ou de trekking, são um item indispensável em muitas viagens de longa duração, mas absolutamente inúteis noutras tantas (eu, pessoalmente, sou grande fã do conforto que proporcionam aos pés e à proteção que oferecem aos tornozelos). O problema é que ocupam muito espaço e, claro está, pesam bastante. Assim, se a maior parte do tempo for passado em ambientes urbanos ou costeiros, vale a pena ponderar se carregar botas de montanha se justifica. E mesmo que, algures no itinerário esteja prevista a trilha Inca até Machu Picchu ou a ascensão ao Kilimanjaro, é provável que consiga alugar umas botas in loco, tão boas ou melhores do que as suas, e a um preço aceitável. Em suma, e uma vez mais, antes de colocar as botas na mochila tente que responder à pergunta: “Valerá a pena carregar um par de botas durante um ano para as calçar apenas 2 ou 3 semanas?”. Se a resposta for “não”, deixe-as em casa.
10. Não levar computador
A grande maioria dos viajantes não o faz profissionalmente, pelo que, na verdade, quase ninguém precisa efetivamente de levar um computador portátil para uma viagem de longa duração. Além do aborrecimento com potenciais roubos, há o fator peso a considerar. Mas a verdade é que se encontram cada vez mais mochileiros nos lobby dos hostels a utilizarem os seus próprios computadores portáteis.
Naturalmente que, nos dias de hoje, estar contactável através de emails e redes sociais é fundamental para muita gente, mas a maior parte dos hotéis e hostels onde pernoitam tem computadores disponíveis (que podem, evidentemente, estar quase sempre ocupados) e há ainda os cibercafés, onde facilmente acede à internet.
Em suma, interrogue-se se precisa mesmo do computador. Para se poder ligar facilmente à internet e utilizar o dispositivo para fazer chamadas, manter contacto com família e amigos e fazer reservas de voos e hotéis, um tablet ou um simples smartphone resolvem provavelmente o problema. E pesam muito menos.
Melhor ainda, se conseguir, desligue-se do mundo e consulte a caixa de correio, digamos, uma vez por semana para manter familiares e amigos descansados e ao corrente da viagem. Para isso não precisa de um computador. E viaja mais leve.
Pela nossa parte, convém referir que transportamos computador portátil e máquina fotográfica profissional, em virtude dos compromissos assumidos com revistas de viagens para a publicação de crónicas e fotos. O peso extra na bagagem é o preço a pagar para poder realizar este trabalho. Fazemo-lo com enorme prazer, mas lá que pesa… pesa.
Glauco Rhuan Manske diz
Bom texto! Viajar leve é sempre melhor! Sem contar que diminui o estresse de fazer e desfazer a mochila. Afinal, quanto mais itens, mais trabalho dá!
Eu discordo em partes no item 9. Geralmente quem gosta de trekking, não vai para uma viagem pensando em fazer só um ou dois, principalmente se é uma viagem de volta ao mundo. Alugar botas é dar um tiro no pé! É um item que você tem que estar familiarizado, caso contrário provavelmente terá bolhas.
Abraço.
Luísa Pinto diz
Olá Glauco
Obrigada pelo comentário. Percebo perfeitamente sua opinião, mas deixe-me fazer a minha defesa. Nós, os pais, gostamos de trekking. Mas íamos fazer uma volta ao mundo com uma criança que, tinha então, apenas quatro anos de idade. O trekking não era o eixo fundamental da nossa viagem, sobretudo na altura em que estávamos na fase do planeamento. quando estamos a contabilizar cada grama que vamos carregar…
Acabada essa grande viagem, podemos dizer que fomos algo conservadores no planeamento. Podíamos ter programado um itinerário menos insular, e com mais desafios, vamos dizer assim. Afinal, a criança gosta e aguenta boas caminhadas!